
O Que Resta é uma instalação criada pelo artista Ivan Padovani para o contexto específico do Projeto Fidalga. Através de uma seleção de objetos coletados ao longo dos últimos 8 anos — restos de reformas, sobras de marcenaria, materiais oriundos de trabalhos anteriores, itens encontrados na rua ou adquiridos em lojas de materiais de construção — a instalação articula uma narrativa que vai além da matéria, propondo uma reflexão sobre o tempo, a resistência e a história invisível que esses materiais carregam.
Na linguagem cotidiana, a palavra "resto" significa o que sobra, o que fica de um todo do qual se tirou uma ou várias partes; implica um estado de insuficiência ou inferioridade em confronto com as coisas a que se dá valor. Mas se evocamos a etimologia latina do verbo restare - parar; não se afastar, ficar constantemente, persistir; resistir; sobreviver -, “resto" remete a ideia de estabilidade, firmeza, resistência. (Maria Angélica Melendi)
Desvinculados de suas funções originais e de qualquer carga simbólica óbvia, esses elementos tornam-se enigmas, potencialmente abertos a diversas leituras. Sua condição de ruptura com a funcionalidade revela-se como uma estratégia de desnaturalização, que provoca o espectador a imaginar novas possibilidades de uso, significado e história. Nesse sentido, a instalação atua como uma espécie de espaço de memória aberta — uma superfície de inscrição de sentidos múltiplos, onde o passado e o presente se encontram em uma confluência carregada de ambiguidades.
A disposição espacial, pensada como uma verdadeira colagem tridimensional, evidencia uma estratégia de composição meticulosa, afirmando uma configuração fotográfica do espaço, ao mesmo tempo que sugere comentários sobre as práticas recorrentes na arte contemporânea como a assemblage, a colagem, a pintura e a escultura. Essa organização exige do espectador uma mobilidade ativa, convocando-o a explorar as múltiplas relações entre os objetos, criando um diálogo sensível entre eles e com os movimentos do corpo. A instalação se revela, assim, como um campo de possibilidades, de pontos de vista e de interpretações que se desdobram em uma experiência espacial dinâmica.
O Que Resta carrega uma poética marcada por uma dualidade intrínseca: a fisicalidade bruta, ordinária, e ao mesmo tempo delicada, quase mística, dos arranjos. Essa tensão entre o tangível e o espiritual, o cotidiano e o ritual, reafirma o papel performático da instalação, em que o ato de montar não é apenas uma operação formal, mas uma ação carregada de significados.
Os objetos que cercam meu corpo refletem a ação possível de meu corpo sobre eles. (Henri Bergson)
Por fim, a obra se apresenta como uma reflexão sobre os processos de produção, os gestos e as estratégias que, na contemporaneidade, tornam-se essenciais na constituição de uma poética que é, ao mesmo tempo, resistência e revelação.
25 de julho de 2025













































